sexta-feira, 16 de outubro de 2015

Alfredo Sabatini, um teimoso idealista


Em 2015, o Palestra de São Bernardo comemora uma marca histórica, os 80 anos de fundação. Oito décadas desde que o nosso saudoso patrono Alfredo Sabatini, revoltado por ser preterido em seu antigo clube decidiu fundar uma agremiação na então pequena e pacata São Bernardo do Campo.

Mais que a data como um todo, cada ano de vida do Palestra representa uma grande vitória ao clube e ao seu torcedor. Para contar um pouco desta rica e gloriosa história, o movimento ‘Palestra Sempre’ faz uma homenagem a este que foi o primeiro de todos os palestrinos.


Sabemos que somos poucos e estamos fadados a encolher. Exatamente por essa razão é que temos o dever moral de contribuir para a difusão e o conhecimento dessa trajetória majestosa que fez nosso Alviverde Batateiro chegar até aqui. Conhecer a história palestrina é apaixonar-se. Um enredo de novela, com tragédias, conquistas, alegrias, tristezas e muitos momentos felizes. 

A família Sabatini chegou a São Bernardo por volta de 1880, eram italianos vindos de Castel dell’novo, província de Napoli na Itália. Alfredo era filho de Samuel Sabatini, casado com Elizebetta Becchelli, proprietário de um secos e molhados que ficava onde hoje se localiza o Paço Municipal, um dos pontos mais importantes do município que inclusive leva o seu nome. 

Alfredo nasceu a 16 de dezembro de 1911, há 103 anos. Como relatam várias testemunhas da época, especialmente no livro ‘Palestra de São Bernardo: Meio século’, de Ademir Medici (1985) - sempre uma grande fonte inspiradora de nossos artigos - São Bernardo de até então era uma cidade pequena com poucas opções de diversão. Uma delas, talvez uma das principais, era o futebol.

E Alfredo Sabatini era um grande jogador. Foi ponta esquerda do rival EC São Bernardo, que na época contava com grande prestígio e sempre montava bons times. O jovem atleta estava em seu auge aos 22 anos em 1935 quando ocorreu o fato que o inspirou a fundar aquele clube do qual hoje celebramos os 80 anos.

Sabatini mesmo contava duas versões de como procederam-se os fatos naquele dia. Na primeira delas, feita textualmente por ele no 40° aniversário do Palestra, em 1975, ele contava (reprodução do livro de Ademir):

“No mês de agosto daquele ano (1935) ocorrera comigo um fato contristador, e que fora provocado pela então direção do glorioso EC São Bernardo. Há alguns anos vinha eu militando nas fileiras do seu pujante esquadrão de futebol, que marcou época e por tantas vezes laureado como uma das melhores equipes do nosso interior. 
Nesse ano o EC São Bernardo registrava no seu calendário esportivo o confronto com uma grande equipe da Capital, a ser realizada na nossa praça de esportes e era aguardado com grande ansiedade por toda a coletividade esportiva de nossa cidade e adjacências. Está claro que o torcedor entusiasma-se com a sua equipe – quando nos grandes acontecimentos, e ansiosos aguardam pelo desfecho; mas o atleta com todo o seu amor próprio, não só aguardo com ansiedade o grande momento, como antecipadamente começa a vibrar de emoção e alegria por participar diretamente da contenda. E nesse dia estava reservada para mim uma grande decepção. Ao dirigir-me alegremente às cabines para mudança de roupa, era informado de que eu não participaria desse grande jogo. Seria substituído por outro atleta que não pertencia ao nosso plantel e que vinha precedido de grande fama por militar numa das grandes equipes da Capital. E muito mais chocante para mim quando vim a saber que esse atleta só faria aquela partida e depois voltaria aos seus pagos. A ensolarada tarde desse domingo ficara gravada no todo meu eu com profundo sentimento e tristeza. Já na segunda-feira, ainda humilhado em meu amor próprio, dirigi-me a sede do clube, e ai ser recebido pelos diretores discorremos sobre o fato. Nesse diálogo fervilharam as evasivas, desculpavam-se e lamentavam sobre o sucedido. Contudo não pude perdoá-los e ao afastar-me dali, fiz o firme propósito de jamais envergar a gloriosa jaqueta alvinegra. Ao retirar-me já uma verdadeira mistura de ódio, aborrecimento e vingança apoderava-se de mim”, conta.


Alfredo Sabatini em foto de 1985 publicada no livro 'Palestra de São Bernardo - Meio Século'


A ideia deste artigo é, na verdade, contar um pouco mais sobre este que foi não apenas um dos maiores, mas o grande mentor da fundação do nosso clube, o personagem principal da sua criação. O Palestra herdou daquele teimoso ítalo-brasileiro nascido em São Bernardo muito da sua personalidade. Muitos daquela pequena cidade possuíam aquelas mesmas características, por isso, logo de cara o Palestra Itália de São Bernardo se identificou e criou adeptos com seus cidadãos.

Voltando ao dia fatídico, saindo do estádio Ítalo Setti, - localizado hoje no cruzamento da Avenida Prestes Maia com a Rua Marechal Deodoro - sede do rival, Sabatini encontrou logo à frente na Praça da Igreja Matriz os amigos o barbeiro José de Jorge e o açougueiro Antônio Garcia e ali, sentados ao meio fio, conversaram por horas sobre o assunto e chegaram a conclusão de que era preciso fundar em São Bernardo um clube para “Bater neles”. Eles, o São Bernardo.

Independente da mágoa de Alfredo, o Esporte Clube São Bernardo era a única opção como clube bem estruturado na cidade. Haviam várias outras formações, mas sempre de vida efêmera e sem o grande propósito de se tornar um clube organizado. Eram muitos atletas para pouco espaço.

A outra versão, dez anos depois da primeira, ao livro de Ademir Medici, Sabatini relata que a decisão foi tomada após ser preterido em um jogo do EC São Bernardo em Catanduva, no interior. Segundo Alfredo, seu pai exigiu que ele fosse e ficou extremamente magoado compartilhando a tristeza do filho. Samuel, seu pai, inclusive teria falecido de tristeza. Evidentemente não pelo acontecido, mas pela grande crise pela qual passava o país naquele momento e que afetou de forma significativa o seu comércio.

O mais provável é que a primeira versão seja a real. Em seu depoimento em 1985, Sabatini não soube precisar o primeiro presidente do clube. Para ele, foi Manoel Corazza. Porém, grande parte dos fundadores de então discordaram afirmando que Manoel jamais fizera parte da diretoria. A biografia de Corazza inclusive omitia este possível fato. Segundo os presentes daquela noite no bar e lance Viarregio o presidente eleito aquela noite seria Caetano ‘Braço forte’ Angelli. Caetano é um dos nomes que mais aparecem no período de fundação do clube.

Manoel Corazza ou Caetano Angelli, o que importa é que o primeiro ato desse presidente foi levar o nome do clube a votação. Quem quisesse ‘Palestra Itália de São Bernardo’ deveria se colocar em pé. Foi unânime.
O nome é claro, foi uma homenagem a Società Sportiva Palestra Itália, atual Palmeiras. Como filho de italianos, assim como a grande maioria ali presente, Alfredo era torcedor do clube. O historiador palmeirense e jornalista Fernando Razzo Galuppo, lembra que nesta mesma época vários clubes surgiram com o nome semelhante ao Palestra devido a grande fase que a equipe vivenciava naquela década. O Palestra Itália havia sido tricampeão paulista em 1932, 33 e 34.

Somente no interior de São Paulo – na época São Bernardo do Campo podia ainda ser considerada ‘interior’ – surgiram Palestra Itália nas cidades de São José do Rio Preto, São Carlos, Rio Claro, Ribeirão Preto e em outros lugares. Dessa grande turma de Palestras somente dois deles marcaram história no futebol profissional, o de São Paulo (Palmeiras) e o de São Bernardo. Como o primeiro mudou sua denominação, o nosso Alviverde passou a ser o único. O Palestra de Rio Preto registrou poucas participações nos profissionais.

Foram muitos os nomes tradicionais de São Bernardo que participaram do evento. Não é possível afirmar com certeza todos os presentes, pois a primeira ata do clube foi perdida. Mas, Alfredo recordava de cabeça.
Segundo ele, o primeiro presidente foi Manoel Corazza; o vice, Caetano Braço Forte Angelli,; 2°vice-presidente, Alfredo Scarpelli, 1° tesoureiro, Maximiliano Finco, 2° tesoureiro, José de Jorge;  secretário geral, Santo Martini; 1° secretário, Alfredo Sabatini e 2° secretário, João Éboli;

Estavam nessa reunião: Manoel Corazza, Antonio Garcia, José de Jorge, Caetano Braço Forte Angelli, Alfredo Scarpelli, Maximiliano Finco, Santo Martini, Eduardo Gerbelli, Antonio Salvador, João Corazza, José Moitinho (Jaú), Estefano Sabatini, Emílio Bonadelli, Carlos Maranesi, Saturnino Dias, Henrique Stangerlin, Dr. Henrique Pereira, Antonio Verselato, Daniel Felipe, João Felipe, João Verselato, Antonio Domingues, Atílio Savordelli, Henrique Fusari, Carlos Priorelli, Domingo Balotim, Anúncio Zanini, Máximo Marcussi, Bruno Ronchetti, Santo Zanon, Angelo Bisognini, Innocente Corazza, João Alves e Alfredo Roquetti.

Alfredo Sabatini justificava que havia pessoas mais experientes e capazes de presidir o clube na época e, por isso não quis  ser o presidente do clube. E neste caso se nota uma curiosa abnegação. Muito mais do que presidir, comandar, ou até se perpetuar no poder, como se vê até os dias de hoje em muitos clubes, principalmente tratando-se de uma cidade até então ‘pequena’; Sabatini plantou uma semente nos corações de cada um daqueles vários integrantes.

Sabatini não se preocupou em ter grandes cargos no clube


Nosso patrono homenageado, talvez – e pouco provavelmente – não tenha sido um dos mais apaixonados e fanáticos palestrinos já existentes. Muitos outros atuaram de forma mais assídua e passional no clube, mas, Sabatini fez o mais marcante: criou a ideia de se fundar nosso Palestra, mesmo motivado por uma frustração ou mágoa que tomou conta dele naquele momento.

Segundo seu filho, Maurício Sérgio Sabatini, o Palestra era para Alfredo como se fosse um filho. Preferia ser um soldado, pois tinha o bom senso de que ajudava mais naquela função. Ou seja, colocou a vaidade de lado para favorecer o clube acima de tudo.

 Tanto é que quando foi eleita a 1ª diretoria, Alfredo exerceu a função de 2º secretário. O esforço daqueles primeiros homens que fundaram o Palestra foi tão extraordinária que poucos dias depois de fundado, eles conseguiram o local para a sede do clube na Rua Marechal Deodoro, ao lado da Società Italiana de Mutuo Socorso Uniti.

“Meu pai participou com os demais da audiência com o prefeito de Santo André (Felício Laurito), pois, à época São Bernardo era como se fosse um bairro daquela cidade, onde conseguiram a autorização para utilização da área que era de propriedade do município onde é hoje a Praça Lauro Gomes. Posteriormente contribuiu também para que fosse conseguido junto ao então prefeito Aldino Pinotti, em titulo de comodato a atual área( Ferrazópolis) onde se encontra o clube".
De fato. Sabatini batalhou pelas duas casas pela qual o Palestra jogou. Embora Maurício fale em ‘comodato’, a área que o clube se utiliza hoje, no Ferrazópolis, há exatos 52 anos, - conforme artigo feito pelo blog ‘Palestra Sempre’ – passou posteriormente, no mandato do prefeito Aron Galante, de comodato para ‘doação’, já que a administração à época considerou o fato de que o terreno no Ferrazópolis era uma indenização ao campo destruído em 1951 pela prefeitura para dar lugar a praça Lauro Gomes. Leia mais: (http://palestrasbsempre.blogspot.com.br/2013/10/palestra-sao-bernardo-50-anos-de.html)
Na vida pessoal, Sabatini era um cidadão atento e participativo socialmente. Ele acompanhou o crescimento e desenvolvimento de São Bernardo. Sua geração, aliás, foi privilegiada. As grandes e principais mudanças na cidade aconteceram em suas épocas, incluindo a emancipação do município, que ele participou com entusiasmo. Rapidamente São Bernardo do Campo deixou de ser uma cidade pequena e agradável para uma metrópole cheia de problemas, embora, ainda com seus encantos.
Alfredo era carismático, um italiano bonachão, cheio de energia por trabalho, pelas coisas que amava, incluindo o Palestra e pela família. Era enérgico, mas extremamente carinhoso, tanto que tinha o apelido de ‘Titio’ pelos amigos. Segundo Maurício, estava sempre bem informado e gostava de contar histórias do passado.
“Era um lutador e trabalhador por suas ideias e objetivos, e com os filhos sempre presente nos momentos necessários com palavras de incentivo, apoio, carinho e inclusive de repreensão”, relata Maurício.
Foi eleito vereador de São Bernardo com pouco mais de 40 anos em uma época de grande turbulência política logo na segunda legislatura de 1952 a 1955. Nessa época, o Palestra já havia perdido seu campo no centro da cidade e possivelmente esse tenha sido um dos fatores que o motivou a entrar na política. Também foi candidato a prefeito em 1955 junto com Tereza Delta (madrinha do Palestra) e Aldino Pinotti. Segundo Alfredo, em relato no livro de Ademir Medici, logo que passou a fazer parte da Câmara, ele levou à tribuna por diversas vezes o tema do Alviverde para pauta, lembrando a importância de dar ao Palestra uma nova casa. A influência política de Sabatini, no entanto, não foi fundamental, pois o mesmo estava rompido com o então prefeito Lauro Gomes de Almeida. O Palestra só reconquistaria sua nova casa anos mais tarde em 1959.
Desde 1958 trabalhou na Justiça do Trabalho se aposentando no início dos anos 80 de forma compulsória. Era bem visto nas classes políticas, pois, sua atuação correta nos sindicatos patronais lhe deram grande credibilidade.
Maurício lamenta que o pai não tenha dado nome a nenhuma via ou praça pública no centro da cidade devido, principalmente por sua atuação como emancipacionista. Alfredo ganhou do amigo Maurício Soares– prefeito por três oportunidades – o nome em uma rua no Jardim Irajá segundo o Projeto de Lei n° 3669 de 24 de Abril de 1991, pouco após seu falecimento no ano anterior. Curiosamente, essa rua não é encontrada no mapa. Alfredo Sabatini deu nome a uma pequenina praça entre as ruas Cristiano Angeli e Guilherme Lorenzoni, na Vila Neide no bairro Assunção.


Praça Alfredo Sabatini, na Rua Cristiano Angeli no bairro Assunção. Homenagem simples demais a um grande 'batateiro'

Seu filho lembra que o ex-prefeito Maurício tinha grande estima por Alfredo desde os tempos em que era advogado do Sindicato dos Metalúrgicos quando tinha contato frequente com seu pai na Justiça do Trabalho.
Em São Bernardo, o fundador palestrino teve atuação importante também em outro clube tradicional, o Alameda Glória, na Vila Duzzi.  O Alameda sempre foi referência em jogos como bocha, ping-pong, entre outros e sempre tiveram os irmãos Marotti como grandes benfeitores, assim como o Palestra tem até hoje uma grande associação com a família Cassettari. 

Em uma reportagem de Ademir Medici em sua coluna ‘Memória’, no Diário do Grande ABC, ele recorda alguns dos momentos gloriosos desse clube e menciona que, assim como o clube do Ferrazópolis, o Alameda sempre teve em suas fileiras gente tradicional na cidade como Sabatini, Giusti, Marotti, Amadei, Gerbelli e outros.

Foto extraída do DGABC pelo jornalista Ademir Medici. Alfredo é o sétimo da esquerda para a direita

O sonho de Alfredo era que o Palestra se tornasse uma agremiação com todos os requintes de grandeza e pujança possível. Nos últimos anos de vida estava satisfeito com a forma que o clube vinha sendo conduzido pelos irmãos Cyro e Zeca Cassettari no final dos anos 80. E de fato, o Palestra nessa época crescia, expandia suas modalidades, acolhia a comunidade do Ferrazópolis em sua sede e estava novamente no futebol profissional de onde havia se ausentado em 1952, mais de 30 anos atrás com uma equipe competitiva formada quase inteiramente por atletas da casa. Não podia ser diferente. 

Cyro e Zeca, que até merecem um artigo só para eles, são até os dias de hoje uma das maiores referências quando se fala em Palestra. Ambos são donos de uma infindável lista de préstimos pelo clube, além de serem pessoas amáveis, e donos de uma biografia irretocável.

O jornalista, ex-jogador, presidente e conselheiro do Palestra, Cyro Cassettari, confirma que Alfredo, embora tenha tido a iniciativa da criação do clube, nunca tivera uma vida ativa entre os diretores, nem mesmo chegou a ser jogador das primeiras equipes, o que de fato é intrigante dado o motivo que o levou a fundação.

"Alfredo não participava assiduamente da vida do clube, mas era uma pessoa maravilhosa, muito querida em toda a cidade, era um 'gentlemann', gente como não se vê mais por ai. Sempre muito elegante, polido, vestido de terno e gravata, cumprimentava a todos, tinha um português corretíssimo e era muito culto", recorda.

Cyro lembra também que pela voz bonita e a articulação das palavras, Alfredo foi por várias vezes o orador do Palestra.


Pela voz bonita e a retórica, Sabatini foi por muitas vezes o orador oficial do Palestra

Em 1947 junto a outros célebres atletas sambernardenses, incluindo vários do Palestra, ajudou na criação da Liga Sambernardense de Futebol em 30 de janeiro de 1947 sendo o primeiro vice-presidente ao lado de Adelelmo Setti, presidente. O primeiro campeonato da Liga, segundo alguns relatos foi vencido pelo Palestra em uma final contra o União (0x0). Outros discordam, dizem que o Alviverde venceu no ano seguinte, em 1948.

Cyro Cassettari, que também foi presidente da entidade, conta que o grande responsável pela fundação da Liga de Futebol foi o ex-prefeito, Higino Batista de Lima. Cyro recorda que Higino era uma pessoa tão modesta que nunca fez questão de aparecer entre os fundadores, mas atuou de forma primordial nela. E confirma: O Palestra de São Bernardo foi o 1° vencedor do Amador.
Anos depois, em 1950, o Palestra se filiaria à Federação Paulista de Futebol e Alfredo nesse episódio, além da sua contribuição protagonizou um momento engraçado. Ele conta no livro do clube que começou a frequentar as reuniões da FPF e a fazer amizades. Garantiu o apoio de muitos clubes, como Portuguesa de Desportos, Portuguesa Santista e a filiação palestrina foi confirmada. Antes disso, muitos dirigentes do EC São Bernardo haviam duvidado que o rival conseguisse o feito. Chegando a São Bernardo, já com a entrada assegurada, Sabatini apostou com vários deles que o Palestra conseguiria a proeza. Ganha a 'aposta', o dinheiro serviu para  comprar meias e chuteiras aos atletas.
Quando o Palestra completou seu cinquentenário, em 1985, Alfredo foi quem deu o pontapé inicial da partida entre o Alviverde e o grande rival, EC São Bernardo em um amistoso realizado no estádio Baetão. O jogo teve grande repercussão na época e reuniu veteranos de todas épocas das duas equipes. 

Falando em EC São Bernardo, muitos devem se perguntar sobre o tal sentimento que o motivou a fundar o Palestra na década de 30. Sabatini tratava o rival com grande respeito em todos os depoimentos possíveis. Aliás, essa sempre foi a grande marca dessa rivalidade: respeito mútuo. As duas diretorias sempre foram cordiais uma com a outra.
Alfredo, ao centro, deu pontapé inicial da partida amistosa entre Palestra e Esporte na comemoração dos 50 anos do clube

Alfredo faleceu aos 73 anos em 1990 em plena Copa do Mundo na Itália. O filho Maurício conta com riqueza de detalhes que faria um passeio com a família em São Lourenço-MG e avisou aos pais que na época moravam à rua Giácomo Versolato sobre sua ida. Alfredo disse que iria junto para a surpresa do filho, pois ele não gostava de locais pacatos.
Após dois dias se divertindo nas termas, haveria o jogo da semifinal entre Argentina e Itália. O jogo foi 1x1 no tempo normal no estádio San Paolo, em Napoli e, 4x3 nos pênaltis. Caniggia fez para os argentinos e Schillac para os donos da casa. Na final, a Alemanha venceria os 'hermanos' por 1x0 e se sagrariam tricampeões. A Itália seria a terceira colocada ao vencer a Inglaterra  por 2x1.

Nem é preciso dizer que Alfredo era apaixonado pela 'Azurra' e já havia ficado muito nervoso dias antes com a eliminação do Brasil para a mesma Argentina. Quando o jogo foi para as cobranças de pênalti, Mauricio lembrou o pai que ele deveria manter-se calmo. Pois, os argentinos venceram nos pênaltis e Alfredo parecia tranquilo, relata Mauricio. Ambos ainda fizeram comentários sobre o jogo e Sabatini pediu para descansar antes de passearem a noite.
Esse trecho, o próprio Maurício relata: “Enquanto ele foi para o quarto fui para a sauna. Quando estava a caminho, algo na minha cabeça falou para que eu voltasse, quando voltei o encontrei no corredor do sua suíte parado escorado na parede. Perguntei o que estava acontecendo e ele me disse que não tinha ar no corredor. Neste momento dei um grito ao porteiro do hotel que me atendeu de pronto. Solicitei a ele que chamasse um médico, e que por sinal era um dos donos do hotel e eu havia conhecido na noite anterior. O doutor tinha o consultório duas casas pra frente do hotel, largou uma consulta no meio e veio no mesmo instante. Ao examiná-lo, disse-me que precisaríamos levá-lo urgentemente ao hospital, pois estava enfartando”, conta.
Mesmo com o tratamento adequado e o socorro imediato, Alfredo Sabatini faleceu 24 horas depois no dia 04 de julho de 1990. Os restos mortais do grande fundador do nosso querido Palestra repousa em um belo túmulo no tradicional cemitério da Vila Euclides, em São Bernardo.
Sabatini, no entanto deixou uma grande família, que hoje está ainda maior. Além da esposa Ildegarda Zobolli Sabatini, com quem teve seis filhos (José Samuel, Eli, Alfredo, Amauri, Tarcísio e Maurício), teve ainda 17 netos (Fabrizio, Alessandra. Eloísa, Roque, Leandro, Alfredo, Fabiana, Gustavo, Tatiana, Samuel, Guilherme, Rafael, Henrique, Thaís, Simone e Patrícia) e 19 bisnetos (Sophia, Lorenzo (faleceu logo após nascer), Victória, Arthur, Mariana, Rocco, Giovanni, Cauê, Enzo, Lucas, Pedro, Luigi, Théo, André, Lucca, Laura, Beatriz, Felipe e Mirela).
A esposa Ildegarda, filha de José Zoboli e Domenica Zoboli  faleceu em novembro de 2012 já bastante idosa, aos 94 anos de idade, assim como Alfredo deixando um grande vazio na família.
Os descendentes de Alfredo nunca mais tiveram contato com o Palestra. Apesar do carinho pelo clube deixado a eles como herança, nenhum ocupou qualquer cargo na diretoria ou fez mera participação. Anos mais tarde, em 2010, no advento das comemorações dos 75 anos do clube, em uma sessão solene na Câmara de São Bernardo, o filho Alfredo Sabatini Filho, o ‘Alfredinho’, como é chamado, representou o pai na mesa de honra em um ato realizado pelo vereador Wagner Lino.
Alfredinho Sabatini representou a família e o pai na sessão solene dos 75 anos do Palestra em 2010 na Câmara de São Bernardo

Alguns anos depois foi criado o Movimento ‘Palestra Sempre’, um grupo idealizado por torcedores que tinha entre os objetivos reunir palestrinos de todas as épocas incluindo descendentes. Deste grupo fez parte a neta de Alfredo, filha de Maurício, Simone Sabatini. Muitas dessas informações inclusive, tiveram também a sua contribuição.
Imaginem você fundar um clube sentado ao meio fio de uma calçada junto a outros dois amigos revoltado por ter sido injustiçado e poder olhar 80 anos depois no que ele se transformou? Não estamos falando de sede social, de condição financeira, de categoria, divisão ou até se ele está em campo ou não, estamos falando do que o Alviverde Batateiro representou na vida de centenas de pessoas direta e indiretamente.
Sabatini sendo lembrado pela torcida 'Loucos do Palestra'

Alfredo Sabatini merece nessas comemorações de 80 anos do Palestra todas as nossas reverências, pois foi ele quem nos proporcionou tudo aquilo que o Alviverde ainda nos proporciona. Foi um idealista, um teimoso visionário, que fez a sua causa se tornar a paixão de tantas pessoas. Para muitos, um clube para torcer, para outros, simplesmente uma vida inteira de dedicação. Alfredo é a razão de muitos sentimentos, amores, amizades, tristezas, gratidão, lealdade inclusive a razão deste texto!
Por tudo isso, obrigado, Alfredo!

terça-feira, 1 de setembro de 2015

Os meus 80 anos!


Há 80 anos eu nasci... Era um começo de noite de domingo na até então pequena e pacata 'Vila de São Bernardo', como se dizia na época. No mesmo dia do Corinthians, no mesmo ano do São Paulo FC, com o mesmo nome e, inspirado na 'Società Sportiva Palestra Italia', o Palmeiras, mas, com personalidade própria. Um jovem chamado Alfredo Sabatini, revoltado por ter sido preterido em seu clube foi quem me deu a luz junto a alguns amigos italianos e descendentes. Eram tempos difíceis.


Minha primeira casa foi no coração da minha cidade, atrás do velho Casarão na Rua Marechal Deodoro, na hoje movimentadíssima Praça Lauro Gomes.  Lá dei meus primeiros passos. Lembro que a bola que eu jogava no quintal sempre caiam em um ribeirão no fundo do campo onde hoje é a Avenida Faria Lima. As centenas de pessoas que passam por ali hoje mal podem imaginar que lá já foi o nosso estádio. Não havia muito o que se fazer naqueles tempos. A principal diversão dos finais de semana daqueles cidadadãos era ver futebol nos campos de várzea. Logo muita gente passou a gostar e a zelar por mim, principalmente a classe mais pobre.

Antigo campo na Rua Marechal Deodoro


Anos depois veio a 2° Guerra Mundial e fui obrigado a mudar meu nome, assim como outros coirmãos que homenageavam países estrangeiros. Quase me batizaram de ‘Paulista’, mas, fomos persistentes e mudamos apenas o sobrenome, tiramos a menção ‘Itália’ para sermos eternamente ‘Palestra de São Bernardo’. E que nome! Quanta tradição e orgulho ele carrega. O único ‘Palestra’ sobrevivente no profissionalismo até bem pouco tempo.

Fiz grandes times nos anos 40. Equipes que envolveram e encantaram a cidade. Tinha, por exemplo, os chamados ‘pretos do Palestra’. Dizem que eles se sentiam mais a vontade no clube. Teve até um deles, Waldemar Fogosa, que largou o Bangu-RJ para vir jogar por nós. 

Equipe dos anos 40 com Ferrinho, Eurico de Azevedo Marques e outros


Já nos anos 50 com um belo time e o clube bem organizado entramos no profissionalismo, porém, veio um duro golpe – talvez um dos maiores de toda nossa vida. Perdemos a nossa casa para o progresso. O estádio foi desapropriado. Daria lugar a principal praça do município. Quase foi fatal, mas, provamos o quanto éramos fortes, o quanto nossas raízes já haviam fincado nos corações sambernadenses. Resistimos bravamente graças a abnegados curadores que lutaram e conquistaram uma nova morada, a nossa sede no bairro Ferrazópolis. Na briga para defender nossa permanência na antiga moradia teve até morte, uma tragédia. Gumercindo Ferreira da Silva levou um tiro quando tentava impedir que as máquinas a destruíssem.

Antigo símbolo da equipe com as iniciais 'PISB' de Palestra Italia de São Bernardo


Foi difícil reconstruir nossa casinha, custou tempo, dinheiro e muita, mas muita dedicação daqueles homens. Moramos de favor, até mesmo na casa dos nossos rivais do Esporte. Aliás, obrigado! Construímos nosso lar em um espaço novo, com novos vizinhos e pessoas para conquistar. O Ferrazópolis não foi apenas uma mudança de endereço, ele norteou a vida palestrina para um novo rumo. Aquele bairro pobre e ermo viu no Palestra uma nova oportunidade de vida e enxergamos nele o mesmo com as famosas e populares ‘escolinhas de esportes’, que reuniam mais de uma centena de crianças e jovens em várias modalidades. Ficamos tão íntimos que nem catraca havia na nossa entrada.

Nova casa palestrina no bairro Ferrazópolis


Nos anos 70 então, voltamos com tudo aos campos e fomos os melhores. Ninguém nos batia nos campeonatos amadores, por sinal, até hoje, um dos mais disputados em todo o país. Vencemos em 72, 73, passamos próximos de vencer nos outros anos. Equipes que hoje disputariam uma Série A2 com o pé nas costas. 

A rivalidade com o velho EC São Bernardo sempre existiu respeitosamente, mas, se há alguém com quem nunca nos demos bem foi com um jovem morador do Rudge Ramos, chamado Aliança Clube. Juntos fizemos grandes e duríssimos duelos, no entanto, não vamos falar de quem já partiu. 

Cyro Cassettari recebe a faixa de campeão Invicto do Amador de 72 das mãos do prefeito Geraldo Faria Rodrigues


E para quem duvidasse da força que tinha o Amador na época, recebemos até mesmo a visita da Majestade do futebol. O Santos do Rei Pelé veio jogar contra o Palestra na Vila Euclides. Imagine hoje, um clube amador receber o Barcelona de Neymar ou Messi? Quase impossível! Tinha quem coçasse os olhos pensando estar vendo miragem. Vencemos ainda os campeonatos de 77 e 78, juvenis, veteranos e começamos a voltar a sonhar com o profissionalismo. Recebi ainda Corinthians de Rivelino e anos mais tarde o Palmeiras de Dudu e vários outros.

Em 1980, já quase um cinquentão, eram muitos os filhos e até netos que havíamos formado com nossas escolas. Tínhamos vôlei, karatê, handebol, futsal, tênis de mesa, até aeromodelismo, modalidade essa que nos rendeu as primeiras viagens e títulos na América e na Europa. Entre as visitas ilustres recebemos até o Bayern de Munique (e demos trabalho). Mas, a ideia era mesmo estar nos profissionais. O Palestra tornara-se grande demais para o Amador. E retornamos em 1986, 35 anos depois de estarmos pela primeira vez.

Palestra vai a Holanda depois de ser campeão sulamericano de Aeromodelismo


Uma equipe feita em casa, por meninos criados dentro do Palestra, meninos do Ferrazópolis, educados para serem atletas e cidadãos, algo fantástico dentro do que o esporte pode proporcionar na formação humana. E deu muito certo! Quanto orgulho daqueles meninos. Quase todos se tornaram pessoas de bem, distintas, grande parte formadas, doutores, homens públicos, enfim.

Ampliei a minha casa. Sabe aquelas reformas que você começa e não vê o fim? Loucura pura. Fiz um ginásio que demandou um sacrifício enorme dos membros, mas, ficou pronto e muito lindo por sinal. Ganhou o nome de Geraldo Faria Rodrigues, um dos grandes prefeitos que tivemos em São Bernardo.

Construção do ginásio foi uma grande saga


Fizemos excelentes campeonatos em 86, 87, 88 e fomos até 1992. Ai então vimos que começava a faltar fôlego. O profissionalismo é difícil e apostamos na base. Ganhamos a primeira taça da Federação Paulista com uma equipe aspirante. 


Uma das melhores equipes palestrinas de todos os tempos formada em casa


Um desses meninos campeões era um negrinho franzino chamado na época de ‘Cacá’, que depois se tornaria um tal de Zé Roberto. Sabe como é pai coruja, né? Eu não queria citar nomes para não gerar ciúmes, mas entre os filhos do futebol outros também nos deram muito orgulho como Raul Zanata, André Dias, Fabinho, Júnior Urso, enfim. Na metade da década ganhei inclusive uma biografia do grande Ademir Medici.

André Dias, zagueiro do S.Paulo e da Seleção inciou no Palestra


Os anos 90 foram de muita transformação, assim como de forma geral. Grandes mudanças viriam. O futebol passava a ser custoso ao mesmo tempo em que o país passava por grandes turbulências econômicas e políticas. Estas combinações geralmente não dão certo. 

Como clube, começávamos a dar sinal de cansaço. Os membros começaram devagar a se dispersar e a sede gloriosa ficava de certa forma obsoleta e grande demais. Assim como fica a nossa casa, cheia de cômodos quando os filhos vão embora: vazia e sem sentido. No futebol, voltaríamos em 1997 e com título. O vice-campeonato da Série B1, ou seja, a 4° divisão do futebol paulista. A taça deu novo ânimo aos dirigentes naquele final de década.

O futebol, no entanto, é gratificante e cheio de emoções, mas, é também ingrato. Nos anos seguintes, 98, 99 e 2000 passamos bem perto, por meros detalhes não subimos para a Série A3 e, devagar o cavalo arreado foi passando e nos deixando para atrás.


O Palestra de Chico Formiga foi vice-campeão Paulista da Série B1 em 1997 e passou perto em 98 e 99


Na verdade, como todo filho do meio, sempre vivemos um conflito existencial. O nosso nome carrega muitos sentidos e não são todos que compreendem isso facilmente. Na nossa própria cidade, de quem levamos o sobrenome, sempre questionaram o fato de não levarmos sermos apenas ‘São Bernardo’, assim como os outros dois clubes existentes. Como se isso diminuísse a importância do Corinthians em São Paulo, do Guarani em Campinas ou do Comercial em Ribeirão Preto. Somos sim, inspirado na atual Sociedade Esportiva Palmeiras, afinal meu pai estava empolgado com o tricampeonato paulista do Palestra Italia em 1932, 33 e 34 e fez a homenagem, mas, nunca compreenderam que temos nossa própria vida, independente, inclusive nunca tendo contato algum com o primo rico da Capital.

Apesar de levar o nome da cidade, Palestra nunca caiu nas graças de toda a cidade. Preconceito pelo nome semelhante ao do Palmeiras sempre existiu


Também nunca fui ligado em política e isso custou caro ao longo da nossa vida. São Bernardo apesar da pujança, de ser a ‘AutoCap’ brasileira, sempre preservou o provincianismo na  política. Coincidência ou não, - já estou velho para entrar nesse mérito – sempre ficamos de escanteio na preferência das administrações municipais. Algo que até pode ter feito falta em alguns momentos, mas, presente nos estádios ou não, temos nossos torcedores fieis pela cidade e isso nos orgulha demais! Palestrino é Palestra sempre! Independente de fase, apoio de quem quer que seja, ou, até mesmo se está ou não em campo. Quem já jogou, torceu e vibrou, ou simplesmente nos teve como vizinho não se esquece. Nunca precisei pagar ninguém para me ver jogar e nem nunca atraímos gente empolgada simplesmente, quem por nós torce é puramente de coração.

Nos anos 2000, meus filhos acharam que aquela casa grande e vazia precisava ter outras serventias. Fizeram dela uma escola, o IPEC (Instituto Palestra de Educação e Cultura). Uma ideia boa, até, mas mal gerida. Eu fui morar em um quartinho no fundo da minha própria residência e passei até a ser olhado de forma estranha lá dentro por quem a frequentava. Sabe como é: os filhos acham que mandam em nossas vidas. Já em 2005 acharam que eu precisava de uma completa transformação de figurino.

PSB foi uma trágica tentativa de dar fôlego ao clube


Quiseram me chamar pelas iniciais, ‘PSB’; mudaram minha roupa, tiraram o verde que eu tanto amei pelo vermelho, assim como meu escudo, o mascote e o hino. Tudo muito bonito, diga-se de passagem, mas, os vizinhos passaram a não me reconhecer mais dentro de tanta modernidade. Queriam me dar um fôlego novo, aquelas coisas de gente velha. Fiz até certo sucesso, viu! Muita gente foi me ver de novo, porém, meus bons e velhos amigos ficaram tristes e magoados com essa mudança de personalidade. Não daria certo. Em 2006 voltei a ser Palestra e em 2008 voltei a ser verde e branco. Ufa! Que alivio! Nada como se sentir a vontade.

Em campo, péssimas campanhas e, tive que me ausentar novamente em 2008 depois de 12 anos consecutivos nos profissionais. Ganhei – quem diria – uma torcida organizada. Verdadeiros loucos. Sempre um incentivo a mais. Voltei em 2009 e fiz uma campanha irretocável que acabou em Taubaté. Mais uma vez foi por pouco! Ganhamos mais um amigo!


Torcida palestrina vibrava. torcia, incentivava e inspirava mesmo em fases ruins


Falando em amigos, como bom ‘caipira de São Bernardo’ - afinal, quando eu nasci nossa cidade era bem pequena -, gosto de contar ‘causos’. Já contei que certa vez um avião fez um pouso forçado no quintal da minha casa na Marechal? Sorte que não havia ninguém jogando no momento. Teve outra vez também que estávamos perdendo uma partida no mesmo campo e os carneiros que pastavam a grama estavam em um cercado ao lado. Quando empatamos o jogo soltaram os carneiros e acabou o jogo. Se eu dissesse também que fui um dos primeiros clubes do Brasil a usar uniformes numerados ninguém acreditaria, por isso eu nem conto.

Se há uma coisa que não posso reclamar nesses anos de angústia foi a ausência de raça. Pode parecer saudosismo e romantismo desse velho aqui, mas, a camisa Alviverde sempre inspirou raça dos seus atletas. Em 2010, um time guerreiro, mas o vício em coisas ruins nos fez faltar pulmão para as horas decisivas. Em 2011, bom, deixa pra lá!

Má fase não significou 'displicência' dos atletas. Ao contrário. Na crise, muitos mostraram amor e respeito à camisa 


Hoje estou velho e como todo idoso que já criou filhos e netos, ando um pouco esquecido. Faltam-me atividades. Sempre me compram um vaso de flor para enfeitar a minha velha e grande casa, até limpam minha piscina, mas não é disso que eu sinto falta. Sinto muito a falta de todos perto de mim, das alegrias das festas, das comemorações, das vibrações, do Ferrazópolis sendo representado por aquele esquadrão, das crianças brincando em meu quintal, daquela bandeira tremulando orgulhosa de suas cores e seus nomes, a torcida cantando gritos de guerra, a bateria, até a cervejinha depois das partidas. Sinto falta daquele friozinho que eu dava na barriga de tantas pessoas, homens, mulheres, crianças, velhos, jovens e meninos que saiam de casa para me ver. Já não encanto tanto como em outros tempos, mas tenho uma história motivadora, exemplo para qualquer clube.

Equipe de 2009 passou perto de subir a A3


Não que eu seja melhor que os outros. Não tenho uma sala de troféus maior que a de muitos – embora sejam centenas delas – precisando de um bom brilho e o cuidado merecido. São tantas coisas que preciso arranjar um tempo e organizar... Aquela coisa que todo velhinho tem na sua casa. Mas, temos nossa alma, nosso espaço reservado no coração de grande parte da cidade, uma história de muita luta, muita intensidade. Recebi alguns telefonemas e mensagens, pessoas que lembraram da nossa existência. Os jornais também lembraram. Dá um certo alívio no coração ser homenageado e saber que somos queridos

Neste dia 1° de setembro de 2015, 80 anos depois daquele célebre dia em que meu pai me batizou no Bar e Lanche Viarregio, na Marechal, acordei pensando no passado; Deu muita saudade de tudo que vivi e de tantas pessoas que já passaram em minha vida e já partiram. Papai Alfredo, Nandinho, Noronha, Carlos Zimermman, Theobaldo, Biguá, Capovilla, Ferrinho, Fogosa, Quatro Paus, Caetano, Caiuba, Atílio, Tereza, Colombo, o Bó... Daqueles que ajudaram a me criar, crescer, que fizeram tudo isso acontecer como Cyro, Zeca, os irmãos Tofanello, Cicarelli, Gianelli, os irmãos Gemada, Ling, Bó, Loro, Beto, Moesy, Ivonete, enfim, não dá para citar todos, seria até injusto!

Alguns heróis palestrinos


Não tenho um corpo atlético e nem fios pretos de cabelo na cabeça, mas, não estou morto e nem moribundo, tenho saúde. O médico me deu muitos anos de vida, disse que enquanto morar nos corações das pessoas não vou partir tão cedo, por isso fico aliviado. Posso dizer que difícil não é fazer 80 anos, difícil mesmo é fazer um ano como eu!

Parabéns para mim!

Ass.: Palestra de São Bernardo!

segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

Os 10 anos em que o Palestra virou ‘PSB’

Na rica e gloriosa história octogenária do Palestra de São Bernardo não se pode deixar de abrir um parênteses para o ‘PSB’, que claro, também é Palestra, mas que foi uma tentativa frustrada de se mudar o nosso destino. A lição, no entanto, foi compreendida: O Alviverde Batateiro é eterno! Não há como se desconectar do passado.

A mudança aconteceu em 2005 e prometia ser a virada para um tempo de prosperidade. Na época, houveram críticas e elogios na mesma dosagem. Enquanto os mais saudosistas se revoltaram, muitos viram ali a chance do clube finalmente crescer. Como já diz o ditado, o tempo é o senhor da razão. E nesse caso foi, provou que uma revolução tão drástica como aquela não poderia dar certo. O Palestra se voltou contra o seu passado, negou suas origens, embora o projeto fosse ousado e bem elaborado. A mudança não é um orgulho, mas jamais devemos nos envergonhar do ocorrido.

Vamos voltar um pouco para relembrar o que ocasionou o projeto. 


Um Palestra desgastado

No fim dos anos 90, o Palestra bateu na trave dos acessos. O fim daquela década talvez tenha sido oficialmente os últimos anos em que os clubes pequenos conseguiram respirar sem ajuda de aparelhos, embora o profissionalismo já fosse algo difícil. Em 1997 o Palestra voltou na 5º divisão de onde estava ausente desde 1992 e logo conseguiu o acesso para a chamada ‘B1’ em um belo time montado pelo saudoso técnico Chico Formiga. O Paulistão chegou a ter até a 6º divisão (chamada de B3). Justamente em 2005 foi que as divisões se unificaram em apenas uma, a chamada ‘Segunda Divisão’.

Em 1999, com Paulo Leme, ex-Santos, como atleta e Lance, ex-atleta do Corinthians como treinador, o Palestra triscou o acesso ao perder nos últimos minutos para o Marília em pleno Estádio da Vila Euclides. Algo tão inacreditável quanto o acesso perdido em 2009 em Taubaté, recém retratado pelo blog ‘Palestra Sempre’.

Em 2000, 2001, 2002 e 2003 o Palestra fez campanhas semelhantes, sem passar nenhuma vergonha, porém não indo tão longe na competição. Infelizmente os registros dessa época são extremamente vagos. Tanto informações dos campeonatos quanto o de imagens, talvez porque na época a internet não fosse tão difundida até então. Em 2004, este que vos escreve já pode falar melhor, pois foi o ano que iniciou suas atividades como repórter e a ter um contato maior com o clube.

O Palestra foi, aliás, o meu segundo trabalho como repórter. O primeiro havia sido um jogo de futsal pela Copa São Bernardo de Futsal no Poliesportivo. Lembro bem de ter chegado tímido a um treino do clube na Vila Euclides durante a semana, era uma terça-feira. O primeiro a me receber – extremamente gentil, diga-se – foi o diretor de futebol, Antonio Schank. Uma pessoa muito amável e que infelizmente, como muitos, deixou de forma injusta o clube. O segundo foi o técnico Carlos Ling, a quem eu entrevistei naquele dia. Ling foi um dos grandes atletas palestrinos na década de 80 logo que o Alviverde retornou ao profissionalismo em 1986.

O Palestra era o único clube da cidade nos profissionais. O EC São Bernardo havia se licenciado em 2002, logo que rebaixado à última divisão, a B3, com uma das campanhas mais horríveis já feitas por um time profissional. Fato que fez o famoso pior time do mundo, o Íbis -PE  desafiá-los em rede nacional, no programa Globo Esporte para saber quem era o pior. O S.Bernardo FCLTDA seria fundado no fim de 2004, mas só entraria em campo em 2005. O fato de ser o único representante batateiro, no entanto, não empolgava nada a torcida que ia ao estádio em pouquíssimo número. Somente parentes, amigos e alguns curiosos.

Desde que deixara de ser um clube de ‘bairro’, o Palestra nunca arrastou um grande público aos campos. Quando voltou aos profissionais no fim dos anos 80 o time já jogava no Baetão, porém, a sua casa mesmo, ainda era o bom e velho Ferrazópolis. Com a decadência de sua sede, pouco a pouco o Palestra se afastaria dela, até que no início dos anos 2000 essa ligação se romperia de vez com a invenção do chamado IPEC (Instituto Palestra de Educação e Cultura) construído no espaço do campo e das arquibancadas do seu estádio. Um episódio triste na nossa história e que marcou o fim de uma era gloriosa.
O fim do campo do Ferrazópolis tornou a Vila Euclides a  nova casa do Palestra (Prefeitura SBC)

A obra do IPEC foi embargada pela Prefeitura que questionou a sua legalidade. Segundo a Câmara dos Vereadores, como o local foi cedido em comodato para uso da comunidade, não poderia ser transformado em um local de uso particular. No entanto, o que muita gente ainda discute erroneamente, é que o contrato de uso do Palestra sobre o espaço mudou ao longo dos anos, passando a ser em outro termo, diferente do comodato, já que foi dado como ‘indenização’ pela perda do seu estádio na Rua Marechal Deodoro onde hoje está a Praça Lauro Gomes. O responsável pela mudança foi o prefeito Aron Galante.

Muitos tentaram tomar a área do Palestra. Se não fosse o novo contrato, certamente o clube já a teria perdido. Hoje, embora a coletividade palestrina não faça real uso do patrimônio do ‘seu’ clube – alguns nem sabem se aquilo pertence ainda, ou não, ao Palestra – o espaço é patrimônio da instituição. Pena que tão mal usado e para o benefício de pouquíssimos.

Voltando a 2004, o Alviverde fizera aquele ano uma bela primeira fase se classificando com antecedência para a fase seguinte. O time tinha Césinha, Marcinho, Le, Ale, Léo, Índio, Cicinho e alguns outros. Na virada de turno uma imbecilidade colocou tudo a perder: a troca de técnico e a chegada de alguns ‘medalhões’ à equipe.
Ling tornou-se auxiliar. Veio o técnico Rotta, que acabara de ser campeão da Copa São Paulo de Juniores com o Santo André sobre o Palmeiras no começo daquele ano e que também conduzira o Grêmio Barueri, em franca ascensão. Junto a ele vieram Roque (ex-Portuguesa de Desportos), o goleiro Gustavo filho do técnico Luis Carlos Ferreira e o veterano Betinho, ex-Palmeiras, que depois viraria técnico.

O linha dura Rotta. Jogadores se queixavam do estilo do técnico (internet)

O resultado das mudanças foi desastroso. O Palestra que fizera uma ótima primeira fase seria a vergonha da segunda. Mas, como a reportagem não se trata de 2004 vamos deixar a campanha deste ano para outra oportunidade. O que devemos lembrar é que a diretoria errou feio, tanto nas mudanças quanto na administração, já que um erro de registro de um atleta fez o clube perder cinco pontos na competição sendo o lanterninha da segunda fase. Foi nessa fase terrível, aliás, que surgiu o embrião da torcida ‘Loucos do Palestra’. Mas essa história fica para 2016 quando ela completa 10 anos.


O ABC no auge... Faltava o Palestra!

Em 2004 o ABC estava no auge do futebol como nunca antes. O São Caetano, que já havia se consagrado um fenômeno desde o início da década com as duas finais seguidas, na João Havelange em 2000, o Brasileirão de 2001 e o vice da Libertadores em 2002 era o atual campeão Paulista. No mesmo ano, o Santo André vencera a Copa do Brasil sobre o Flamengo em pleno ‘Maracanã’, uma conquista homérica. Faltava São Bernardo do Campo... O responsável por preencher essa lacuna só poderia ser o Palestra.

Santo André e São Caetano estavam no auge. Enquanto o Azulão era o atual campeão paulista, o Ramalhao era campeão da Copa do Brasil (internet)

Uma reportagem da finada Gazeta Esportiva se pautava exatamente nessa questão. O título da matéria falava: ‘O santo que falta no ABC’, contando um pouco da história do Palestra, dos seus planos e suas dificuldades. O clube não contava – como quase sempre em toda a história e ao contrário dos seus vizinhos que estavam no ápice – com apoio da administração municipal. Na própria matéria da Gazeta Esportiva, o presidente Fábio Cassettari contava que era difícil manter o elenco com o único patrocínio de uma fábrica de zíperes.

Aquele final de campeonato em 2004 para o Palestra foi amargo. Várias goleadas para um time que sabia que tinha um bom potencial. Alguma coisas precisavam ser mudadas nos métodos e nos conceitos do clube caso a equipe não quisesse seguir os rumos do rival EC São Bernardo.

No final do mesmo ano, logo após o fim do Paulista em meados de setembro, a diretoria começou a pensar em uma estratégia de mudança. Uma das principais metas era se aproximar da política. Uma habilidade que o Palestra nunca teve.

O velho Palestra já não empolgava como na década anterior e poucas soluções pareciam suficientes. A imagem do clube estava cansada, desgastada. Era preciso criar a ideia de algo quase totalmente novo para gerar credibilidade. 

Embora a nova roupagem ao já veterano clube viesse a causar uma enorme ferida no coração dos palestrinos, especialmente os da velha guarda, o projeto de marketing era bem feito, embora fosse uma aposta arriscada demais. Para arregimentar mais torcida, patrocínios e parceiros o Palestra precisava começar vencendo e empolgar para que ‘talvez’ os torcedores mais antigos conseguissem alguma simpatia. Se não emplacasse, além de não conquistar os novos adeptos, perderia os veteranos.


A nova roupagem

Não temos os detalhes dos acordos políticos, mas o fato é que o Palestra seria o novo clube da cidade com o apoio da prefeitura. Curiosamente, o então Secretário de Esportes e um dos homens fortes da administração municipal, Edinho Montemor – que viria a ser o presidente do S.Bernardo FC – foi quem sugeriu que o clube abandonasse o nome ‘Palestra’ e mudasse as cores para que acabasse a eterna associação do Palestra à Sociedade Esportiva Palmeiras, algo inevitável e corriqueiro em nossa história. O nome pensado foi ‘PSB’, siglas das iniciais do nome. Um nome simples, fácil de ser decorado, assim como PSV e PSG, por exemplo.
O que se dizia nos bastidores era que o nome tinha outra razão de ser: o partido do prefeito Willian Dib (PSB), mas o fato não procede. A idéia era mesmo apenas diminuir o nome antigo. Edinho, que foi jogador do Palestra e campeão nos anos de 77, 78 e 79 no Amador, confirma a informação. A sugestão foi dada em uma conversa entre Cassettari e ele.

Se deixaria de ser ‘Palestra’ para evitar comparações com o Palmeiras, não teria sentido manter as cores verde e branca. As cores escolhidas foram o vermelho e o branco que, segundo anunciado oficialmente representavam as cores do município. O vermelho também está na bandeira da Itália, as cores que inspiraram a fundação da Societá Palestra Itália e consecutivamente também o nosso Alviverde.

Mudou também o mascote, um ‘cão São Bernardo’ desenhado pelo cartunista Juarez Correa, substituindo o pouco popular periquito que o palestrino e palmeirense Cyro Cassettari havia inventado, e o hino, que ganhou uma letra bonita, bem composta por Wagner Donizeti Lima, um conhecido jornalista da TV Gazeta, que agora integrava a diretoria. O hino antigo, composto pelo eterno professor das escolinhas, José Rossi, poucas vezes foi ouvido, embora a letra esteja no livro do cinqüentenário do clube e a partitura guardada na sede.

O Periquito deu lugar ao Cão São Bernardo (palestra.webs)

Todas essas novidades foram anunciadas em uma solenidade na sede do clube no Ferrazópolis com a presença maciça da imprensa no início de janeiro. A velha guarda também compareceu, mas ficou evidente com o passar do tempo que havia um certo desconforto com a mutação do velho Palestra.


O planejamento previa alcançar as divisões superiores logo. Haveriam divisões de base, sub-15, sub-17 e sub-20, bem organizadas, com comissão técnica, centro de treinamento e até patrocínio. O próprio IPEC estaria na camisa listrada em vermelho e branco – semelhante a do Bangu-RJ. A promessa era ser auto-sustentável.

O estádio da Vila Euclides, que há anos estava bastante obsoleto passou por uma boa reforma e os jogos eram transmitidos pela TV local, a TV+, que também estampava as camisas da equipe. Uma nova diretoria foi montada, inclusive com a vinda do experiente cardeal são paulino, Carlos Caboclo, que vinha passar um pouco do seu conhecimento na montagem da comissão e do time.

Se todos planos tivessem progredido, certamente o PSB teria feito um grande sucesso, mas nada na vida do Palestra é fácil. O comentário de que outra ‘nova’ equipe surgiria já corria solto nos bastidores do futebol da cidade e logo na sequência do anuncio do Palestra repaginado veio a notícia do surgimento de outro clube, o São Bernardo FC. Enfim, o desfecho desse capítulo da nossa história, em se tratando do Alviverde não é tão imprevisível. Retrataremos lá na frente.
A equipe que disputou a Copinha. PSB caiu no difícil grupo de Galo e Furacão, mas lotou o estádio (Acervo Palestra SB)


Antes, no intervalo entre o anúncio e a estreia da equipe criou-se uma boa expectativa. O técnico seria o mesmo que havia encerrado a temporada passada, o durão Rotta. Este que vos escreve, ainda um iniciante no rádio, escolheu continuar cobrindo o cotidiano do clube que estava alojado e treinando no Clube da Ford, no bairro Alvarenga. Ia a pé aos treinos. A paixão pelo clube efervesceu naquela época. 

Enquanto isso, estreava a equipe na Copa São Paulo. O PSB caiu no grupo de Atlético-MG, Atlético-PR e Tocantinópolis. A estreia foi contra os nordestinos em um jogo cheio de pompa e com o estádio lotado de gente, 10 mil pessoas. Nas arquibancadas todos queriam ver o novo time de São Bernardo. O Palestra perdeu, assim como perderia os dois jogos seqüentes. Mesmo assim, as derrotas não desanimaram a expectativa de ver os profissionais do clube jogar.

Uma lembrança inesquecível daqueles jogos foi o gol olímpico – possivelmente um dos mais bonitos da história da Vila Euclides – anotado pelo lateral direito Césinha, remanescente de 2004, neto do jogador Riberto do São Paulo.


Começa a competição

 O novo São Bernardo também estaria no Paulista da Segunda Divisão naquele ano. Saiu a tabela da competição que, como já dito, seria unificada e divida em grupos. O PSB estaria no grupo 6, ao lado dos times litorâneos, além do Barcelona de Capela do Socorro e Osasco.

Primeiro time a vestir o uniforme do 'PSB'. Vitória diante do novato Cubatense por 2x1 (Jogos Perdidos)


Foram 40 equipes divididas em seis grupos, alguns com sete times outros com 0ito. A estreia seria diante do Cubatense no dia 11 de abril de 2005. O primeiro da história dos adversários. 

O PSB venceria por 2x1 com gols de Césinha e Daniel. A campanha na primeira fase, aliás, seria muito boa. Mas a essa altura o Palestra já não contava com a principal aposta daquele ano, a ajuda da administração municipal. O novo time já nascera em berço de ouro, cercado de privilégios e preferências. Eram vários os políticos que compunham a sua diretoria.

Veio depois a partida diante do Jabaquara, também em casa. O PSB era uma equipe bem arrumada, bem treinada e com um bom elenco à disposição. O Leão da Caneleira tinha naquele ano uma parceria com o time do Rei Pelé, o Litoral FC e começou o jogo abrindo o placar por 2x0. Ainda na mesma etapa o Palestra fez mais três gols e o goleiro Carlos Luna ainda defendeu um pênalti.

O jogador Mineiro, hoje fora do futebol, lembra com saudades daqueles tempos. Ele relata que na partida diante do Jabaquara um empresário engordou o bicho dos atletas. “Nunca tinha visto tantos empresários em um mesmo vestiário. Ai um deles levantou a voz e disse que pagaria mil reais para ser dividido entre os jogadores se o empate permanecesse, e dois mil caso virássemos. Na segunda-feira chegou o nosso dinheiro”, conta.

Mineiro vinha justamente do Jabuca, onde ficou por dois anos. Atuou ao lado de Dick, que em 2014 foi campeão Paulista jogando pelo Ituano.

A terceira rodada foi contra o Guarujá fora de casa no estádio Antonio Fernandes. Viria a primeira derrota por 3x2. A quarta rodada, novamente em casa foi contra o Barcelona, empate em 2x2.
Palestra empatou com o Barcelona por 2x0 (Jogos Perdidos)


O 1º derby da cidade

No dia 21 de maio aconteceria o primeiro derby da cidade. Os jornais deram grande destaque ao duelo. O Palestra perderia por 2x1 em um jogo duro, onde o agora ‘alvirrubro’ deu o máximo de si. O PSB jogou com Carlos Luna, Marcelo, Samuel, Thiago Locatelli, Mineiro e Leandro Ono, Da Silva, Jardel, Clóvis e Piu-Piu. O jogador Thiago, ou ‘Piu-Piu’, como era chamado foi o autor do único gol palestrino. 

O PSB saiu derrotado do primeiro duelo contra o seu novo rival, 2x1 em um jogo eletrizante (Jogos Perdidos)


As fotos do pessoal do site Jogos Perdidos, do qual retiramos grandes informações e fotos para esta matéria (desde já agradecemos) comprovam que, embora a torcida dos rivais fosse maioria, a do Palestra não decepcionou neste duelo.

Aquela derrota doeu muito no PSB, A rivalidade entre os dois times ia muito além do campo. Era política pura envolvida. Tanto que custou o cargo do técnico. 

Rotta estava em uma ótima fase da carreira; veio ao Palestra com bagagem e a tarimba de ter levado o Santo André e o Barueri ao sucesso, porém, internamente, perdia cada vez mais o comando por sua personalidade muito forte. 

Aquela semana foi de mudanças na equipe. O clima no Clube da Ford ficou tenso. Junto com Rotta, alguns atletas deixaram o PSB e vieram reforços. Muitos boatos rondavam o elenco. Alguns deles diziam que os atletas se envolviam em constantes ‘festas’. Todo o planejamento e esforço não poderia ir por ralo abaixo. 

Carlos Caboclo, com vivencia no Tricolor indicou o técnico José Nogueira. Um treinador no melhor estilo são-paulino, calmo, estudioso e disciplinador. Nogueira caiu como uma luva naquele momento.

No jogo seguinte, em Registro, comandado por um interino, o Palestra foi derrotado pelo Comercial, 1x0.

Veio o returno, e o Palestra sofreu uma revanche do Cubatense por 1x0 já sob o comando de Nogueira. Era cedo para tirar conclusões, mas o resultado preocupou a diretoria. Na 9º rodada, no entanto, o PSB retomou as vitórias goleando o Osasco FC por 4x1 na Vila Euclides. O clima era de reabilitação na concentração.

Fomos ao estádio Espanha encarar o Jabaquara e voltamos a perder: 2x0. Nesse jogo, uma passagem até irrelevante, mas curiosa:

O assessor de imprensa do PSB, o jornalista José Isaías, muito conhecido no meio, não gostou do fato deste repórter viajar com a delegação no ônibus, como fiz muitas vezes desde então, embora autorizado pelo técnico. Em Santos, na cabine de imprensa ele afirmou que eu deveria ‘voltar a pé’, mas acabei defendido pelo sempre zeloso diretor Antonio Schank. Aquele fato me chateou muito. Cheguei até a pensar em deixar o Palestra, mas eu nunca esqueci o carinho do veterano Schank. O fato curioso é que este mesmo novato seria a partir do ano seguinte o assessor de imprensa do clube por cinco anos.

Em casa, vencemos o Guarujá por 1x0 e o Barcelona por 2xo. 


A revanche sobre o rival

No segundo turno, os palestrinos estavam ansiosos para encarar o rival. De vermelho ou de verde, curiosamente, o espírito da garra e da raça palestrina prevaleceu. A determinação e a união eram talvez os únicos resquícios herdados do Palestra. Sempre o mesmo espírito: lutar contra tudo e contra todos. 

Atacante Clóvis do PSB tenta marcar (Jogos Perdidos)


Assim como no jogo de ida, o duelo ganhou as páginas dos jornais. Ao contrário do outro time da cidade, o Palestra não tinha nenhuma torcida organizada, muito menos patrocinadas pelo próprio clube. Na arquibancada palestrina apenas pais, parentes, amigos de jogadores e alguns curiosos. Um número razoável.
Nessa época este repórter pertencia ao STI Esporte cobrindo dia-dia do PSB e acabei não sendo  escalado para compor a equipe que transmitiria a partida pela web e por uma rádio que transmitia apenas local para os aparelhos que estivessem nas imediações do estádio. Poderia ver o jogo das arquibancadas, o que eu achei ótimo, pois queria muito poder ver o jogo como torcedor.

“Nessa altura eu já tinha um envolvimento forte com o Palestra. A gente convive vários dias da semana com aquelas pessoas, partilha da ansiedade, das dificuldades, alegrias, enfim, já estava contaminado pelo palestrianismo e torcia muito para que vencesse aquele jogo”.

A partida, além da recente rivalidade e dos fatores políticos, valia também continuar na briga pela classificação à segunda fase. Para avançar o Palestra necessitava vencer. E... Venceu!

Vitória palestrina foi 'banho de sal grosso' na competição(Jogos Perdidos)


Novo técnico, novo espírito

O Palestra já contava com reforços que deram peso ao time como a subida de alguns atletas da base - Uma bela base, diga-se de passagem - e o zagueiro Rancharia, por exemplo. Jogador clássico que vinha do São Caetano. O feito de derrotar aquele rival coube a Richard.

O gol, é claro, não teria graça se não fosse quase aos 42 minutos do segundo tempo depois de um jogo muito duro, tático, com o dedo dos técnicos Sousa e Nogueira. Vitória por 1x0 e uma comemoração interminável de jogadores e torcida. Ninguém apostava no PSB. O maior número e a ‘empolgação’ de momento dava o favoritismo total ao adversário.

Após um contra ataque ele encobriu o goleiro na intermediária e fez um baita golaço. Do lado da social foram só grito e festa da diretoria. O diretor Schank era um dos mais efusivos junto ao presidente Cassettari. Aquela vitória no dia 09 de julho lavou a alma do Palestra.

“Eu não aguentei na hora do gol e comemorei bastante. O pessoal do São Bernardo não gostou e até reclamou para a direção da emissora, mas eu sinceramente nem liguei”.

No último jogo da primeira fase o PSB venceu o Comercial por 2x0 e confirmou sua ida para a próxima fase. Neste ano eram apenas três fases. Além de Palestra, classificaram-se no mesmo grupo o rival São Bernardo FC e Jabaquara.

Na próxima fase, o clima foi outro. Vários fatores mudaram o clima da equipe, parecia final de festa. Alguns jogadores deixaram o time, subiram mais atletas da base e a história dos anos anteriores se repetiu: Todo esforço acabou sendo em vão.


A decadência do projeto

O PSB já não tinha mais bala na agulha. No decorrer do campeonato os parceiros foram se distanciando e o orçamento teve que encolher. Passar para uma outra fase, e até divisão, seria um custo da qual o Palestra não tinha garantias. A campanha foi sofrível, apenas um ponto em seis jogos. Palestra 0x3 Guaçuano; Santacruzense 2x0 Palestra; Penapolense 1x0 Palestra; Palestra 3x4 Penapolense; Palestra 1x1 Santacruzense e Guaçuano 5x0 Palestra.

Equipe da segunda fase já bastante diferente da primeira. (Jogos Perdidos)

O diretor da equipe na época, Antonio Schank, hoje com 80 anos e muita experiência diz que faltou ‘vitaminar’ o time naquela fase “Toda vez que o clube passa de fase é preciso aumentar o dinheiro, nosso futebol hoje funciona assim”, comenta ele, que relata tudo com cautela. O Palestra ainda lhe causa certa mágoa. Não o clube, mas as pessoas “É uma pena que o Palestra hoje não esteja no futebol, é um clube muito tradicional. Os outros clubes vão fechar, acabar e o Palestra não, é um clube eterno”, lamenta. 

Schank permaneceu no Palestra de 2001 a 2010. “Desde que sai do Santo André eu fui para o Palestra, fazia de tudo lá, tomava as providencias necessárias, urgentes, ônibus, pagamento, campo...”, lembra. Schank perdeu um pouco do seu espaço aquele ano com a chegada de Carlos Caboclo, mas era leal ao clube, não desistiu e prosseguiu seu trabalho com afinco. Foi treinador das escolinhas do IPEC, zelou pelo patrimônio do clube como fotos, troféus, quadros e camisas. Manteve tudo sobre a mais perfeita ordem na sede do clube e choraria hoje se visse onde tudo isso foi parar. Um amontoado de relíquias tratadas com entulho pela atual diretoria.

O veterano, ex-jogador de Corinthians de Santo André e Juventus-SP, e também treinador do falecido Aliança Clube, acha que São Bernardo do Campo não possui espaço para dois clubes. “Um atrapalha o outro. Dois times em uma mesma cidade quase nunca dá certo”, afirma.
Schank era o 'faz tudo' do Palestra (Metodista)


O campeão da Segunda Divisão aquele ano foi o São Carlos FC, um clube novo, com nenhuma ligação com o tradicional Grêmio Sãocarlense. O vice foi o Osvaldo Cruz. Subiram além do campeão e do vice o novato e o rival São Bernardo FCLTDA, além da Santacruzense, que por ironia do destino aquele ano contava com Carlos Ling como técnico. 

Mais uma vez vivíamos o mesmo dilema: a falta de continuidade. Os projetos eram ótimos, realmente revolucionários, como citava um certo trecho do nosso novo hino, mas não tinha sequência. Se o Palestra quisesse novamente entrar em campo no ano seguinte teria que pensar em uma nova fórmula. E tudo aquilo desgastava ainda mais a imagem do Palestra. Ou seja, a roupa era nova, mas o modelo ainda era o mesmo!
Havia ainda em disputa os campeonatos Sub-20, Sub 17 e Sub-15 aonde o PSB também fez boas campanhas. Só para citar um dos resultados, o time aplicou uma goleada no EC São Bernardo - tão frágil quanto suas últimas equipes profissionais - um suntuoso 7x1.

 
Vitória por 7x1 diante do EC São Bernardo no Clube da Ford (Jogos Perdidos)

Houveram ainda bons jogos a se acompanhar naquele ano, como os dois derbys entre PSB x São Bernardo FC no sub 15, 17 e sub-20. No sub-20 atuaram jogadores do profissional de muita qualidade, como por exemplo, o lateral Leandro Ono, o volante Éder e os jogadores Willian – remanescente de 2004 e que permaneceria para 2006 – e o meia Amauri, um jogador diferenciado que depois passaria por São Caetano, Guarani, Corinthians e Santo André, onde atuava quando veio a falecer precocemente aos 21 anos envolvido em um acidente de moto em 2008. 

A notícia foi dada com muito pesar nos jornais da época. Amauri era uma grande promessa do futebol. Outro jogador já falecido desta temporada foi meia esquerda Ricardinho, que segundo relatos morreu no vestiário vítima de um mal súbito em meados de 2010.

Equipe Sub-20 do PSB. Amauri é o quinto da esquerda para a direita (Jogos Perdidos)

O fim do PSB

O ano se encerrou e a frustração foi inevitável. Com o acesso conquistado pelo São Bernardo FCLTDA, o Palestra estava fadado a viver o escanteio na cidade. Certamente sobraria pouco espaço para o Alviverde. 
Cogitou-se nos bastidores de que com a debandada de parceiros, patrocínios e pessoas do clube, o PSB poderia até mesmo se licenciar em 2006, um golpe muito duro para quem acaba de anunciar tantos planos para o futuro. Seria vergonhoso.

O clube então resolveu em 2006 terceirizar o futebol. Três empresários tocariam o departamento por três temporadas: Otto Giorgi, Marcelo Muoio e Milene Castilho. Todos advogados e com alguma ligação com o Palestra. Otto chegou inclusive a ser atleta das escolinhas do clube nos anos 80 no Ferrazópolis, comandadas pelo professor José Rossi.

O Palestra de 2006 voltou a usar o verde e branco, mas como terceiro uniforme (Jogos Perdidos)


A boa notícia: O PSB voltaria a ser Palestra, porém com a mesma roupagem atual. A camisa verde também ia voltar, porém como terceiro uniforme. Hoje, vemos que insistir naquele projeto de marketing elaborado em 2005 não fazia o menor sentido, porém a idéia era não confundir o público com tantas mudanças constantes. 
Vermelho ou não, o certo é que os problemas ainda eram os mesmos: falta de investidores.

Os três novos sócios do futebol do Palestra eram bem intencionados. Tentaram por vários meios articular parcerias e estratégias de marketing, mas como já dissemos aqui e dizemos sempre, nada é fácil na vida do Palestra. Aquele ano, embora o time não fosse ruim e tivesse feito bons jogos no melhor estilo da ‘raça palestrina’, o time dessa vez não passaria para a segunda fase.

Se 2006 parecia ter sido ruim,embora com alguns destaques para o jogador Danilo, que chamou atenção de toda grande mídia por ser surdo e mudo, a parceria com o Clube Mesc nas divisões de base e pela criação da torcida organizada, o ano 2007 foi ainda pior, só sendo superado pela campanha trágica de 2011.

Com a camisa vermelha, o já 'Palestra' conquistou dois únicos títulos, a Copa Bandeirante - Sub-15 em 2006 e 2007 em uma parceria com o Clube Mesc.

Palestra campeão da Copa Bandeirante organizada pela Associação Paulista de Futebol (Acervo Palestra SB)


Este já não era mais o PSB como relatamos acima, porém ainda era um Palestra com algumas mutações. Mutações que só se encerrariam em 2008 quando o Palestra anunciou o rompimento da parceria e o licenciamento do profissionalismo.

Foi triste se licenciar após 10 anos consecutivos no profissionalismo. Mas a promessa era de que o Palestra se ausentaria para retornar mais forte em 2009. E voltou! A história deste retorno está relatada neste blog. A palavra na época foi ‘Não é um Adeus , e sim um até logo!’.
A equipe de 2007 foi uma das lanternas da competição (Jogos Perdidos)


O retorno do eterno Alviverde Batateiro

Quem é palestrino - e talvez apenas os palestrinos saibam - deve ter tido a mesma sensação. Existia nesse período de 2005 a 2007 um clima desconfortável aos torcedores. Muito parecido com aquela sensação de quando você sai de casa com alguma roupa que você não gosta ou se sente bem. Por mais que o tempo tivesse aliviado aquela mágoa da mudança, havia ainda certa inquietação de que aquele não era o bom e velho Palestra de São Bernardo. É como passar uma temporada na casa de algum primo. Por melhor que seja - e não foi – nada é como voltar a casa da gente.

Torcedores mais antigos, veteranos, ex-jogadores, gente do Ferrazópolis, enfim, muitos diziam que haviam ‘matado’ o glorioso Palestra, que aquele novo time não era o simpático ‘Ferrão da Vila’. Ou seja, a situação anterior a 2005 se agravou ainda mais. Além de não arregimentar novos torcedores, o clube havia perdido os que restavam. O Palestra necessitava voltar a suas origens, voltar a ser o Palestra que muitos aprenderam a amar. Até então, tudo isso era meramente uma sensação.

Nessa ocasião, este que vos escreve teve a grande honra de participar da decisão de devolver ao Palestra sua verdadeira identidade. “Era um momento difícil, pois há muito tempo não ficávamos de fora do futebol, toda a imprensa lamentou muito aquela ausência. Como assessor de imprensa posso dizer que o Palestra sempre foi muito querido pela mídia de forma geral. Aquela dificuldade do momento nos uniu em torno do clube. Certo dia, em uma longa conversa com o presidente Fábio Cassettari em seu escritório ele me perguntou o que eu achava em voltar a ser verde e branco como antes. Minha grande preocupação era na repercussão de se fazer mais uma mudança em um curto intervalo, mas colocando os fatos na balança concordei prontamente e, ali, naquele instante o Palestra voltou ao seu escudo e camisa verde”.

A camisa com o escudo novamente verde foi apresentada em um evento na sede do clube (Acervo Palestra SB)


Foi a melhor decisão que poderíamos ter tomado nos últimos anos. Em um evento na sede do clube anunciamos a programação do ano e a grande novidade, a volta do verde e branco. Cassettari prometeu abertamente que jamais o Palestra mudaria novamente suas cores e símbolo. A imprensa repercutiu a notícia. Um boletim do clube chamado ‘Gazzetta Palestrina’ destacava a novidade.

Se o grande feito de continuar Palestra mesmo após o período da Segunda Guerra, ao contrário de Palmeiras e Cruzeiro pertenceu ao nosso clube, como ter vergonha, negar ou simplesmente querer mudar isso? O verde e branco é sim inspirado na Sociedade Esportiva Palmeiras, até então Palestra Itália, mas isso não cria elo com a agremiação, a não ser o fator histórico. Ao contrário, o Palestra nunca teve sequer parceria com o Palmeiras. Algo que claramente não teria problema algum, mas o fato é que nunca houve. Ser ainda hoje ‘Palestra’ é sem dúvida um dos maiores orgulhos do palestrino.

A evolução dos símbolos do Palestra
Do PSB sobraram o hino – que depois o autor da nova composição, Vágner Donizetti Lima – adaptou com novas estrofes exaltando o verde e branco, o mascote, o ‘cão São Bernardo’, bem mais original que o antigo periquito e, a grande lição de que jamais podemos nos desligar de nossa história, das nossas tradições, independente da fase. O Palestra será Palestra, sempre!